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A seca prolongada que afeta Roraima por consequência do fenômeno El Niño Godzilla também atinge as terras indígenas, entre elas a Yanomami e Raposa Serra do Sol. Na comunidade do Piaú, na Terra indígena Yanomami, região do Toototobi, divisa entre os estados do Amazonas e Roraima, os afluentes dos maiores rios secaram.

 “Nos rios maiores como Uraricoera, Demini e Catrimani, ainda tem água, porém os outros rios (afluentes) secaram, estão mortos”, disse Dário Kopenawa Yanomami, coordenador de políticas públicas da Hutukara Associação Yanomami (HAY), e filho de Davi Yanomami, líder da etnia. 

O rio Uraricoera, que nasce na Serra de Pacaraima, forma na confluência do rio Tacutu, o rio Branco, que banha boa parte do Estado de Roraima.

Dário Yanomami disse que a estiagem é tão preocupante, que os pajés (xamãs) estão preparando um ritual. “Eles vão chamar a chuva, pois quem vai acabar de vez com o fogo, não somos nós e sim a natureza”, afirmou.

Na aldeia Piaú, segundo Dário Yanomami, a saída para o abastecimento foi cavar um poço artesiano. “O único rio (Piaú) que abastece a aldeia, onde vivem mais de 120 índios, está muito seco. Eles tiveram que cavar um poço artesiano para não morrer de sede. Depois pediram ajuda à Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) que contratou uma empresa, que deu continuidade ao trabalho. Agora estão mais tranquilos”, disse. A Sesai é o órgão responsável pela saúde indígena do governo federal, vinculada ao Ministério da Saúde.

Segundo Dário, com a estiagem a vegetação do território indígena ficou muito seca e rodeada de fumaça por causa do fogo. Na TIY, com 9.664.975 hectares (96.650 km²), vivem 22.500 indígenas em 240 comunidades. Não há dados dos focos de incêndios na reserva.

Para tentar amenizar os incêndios, Dário disse que a Hutukara Associação Yanomami está sensibilizando os indígenas para não tocarem fogo nas roças nesse período. Ele disse que a fumaça que invade as aldeias yanomami causa sérios problemas de saúde como gripe e pneumonia, as crianças são as mais atingidas. “A Secretaria de Saúde Indígena (Sesai) enviou técnicos de enfermagem e alguns médicos estão nos 37 Pólos Base de Saúde para atender a demanda”, disse.

Para Dário Yanomami, a causa dos incêndios e da estiagem extrema na terra indígena e nas demais regiões da Amazônia e do país não é recente. Ele diz que nos últimos tempos, o desmatamento e a destruição dos recursos naturais incidem nos problemas que hoje são identificados de forma mais dramática. “Para nós, a natureza está muito chateada, por isso a revolta”, disse ao lembrar o desastre ambiental ocorrido no mês de janeiro em Mariana (MG), devido à mineração.

A Terra Indígena Yanomami foi homologada em 1992. No início dos anos 90, mais de 40 mil homens invadiram a reserva atrás de ouro e cassiterita. Na ocasião, houve o registro de muitas mortes de indígenas por epidemias e violência. O líder Davi Yanomami denunciou a morosidade do governo brasileiro e dos impactos da extração ilegal de ouro na Nações Unidas (ONU). Mesmo fechado, as incursões de garimpeiros nunca terminaram.  

Segundo Dário Yanomami, ainda existe a presença de garimpeiros na reserva. “Eles estão destruindo nossos rios, devido ao uso do mercúrio e a retirada de areia dos seus leitos para encontrar minérios. Nossos rios não são mais os mesmos; faz muito tempo. A natureza está dizendo para gente que se nós continuarmos a fazer tudo isso, a mexer com a vida da floresta, o mundo vai ficar chateado e vai acabar com tudo. Isso é o pensamento dos pajés da nossa região”, disse.

Estiagem mudou calendário de plantios

Na terra indígena Raposa Serra do Sol, nordeste de Roraima e fronteira com a Venezuela, a situação é menos grave com relação à questão de focos de incêndio, porém segundo o coordenador do Conselho Indígena de Roraima (CIR), Mario Nicacio em algumas comunidades como a de Urubuzinho, um lago que nunca havia secado, está totalmente sem água desde o ano passado.

Já prevendo a uma estiagem mais intensa, os indígenas da Raposa Serra do Sol fizeram um estudo em 2015 sobre mudanças climáticas e também o Plano de Gestão Territorial e Ambiental (PGTA).

“Nesse trabalho identificamos muito essa mudança de clima. Mudamos, por exemplo, o calendário de plantios. Nesses encontros, os mais velhos diziam: vai chegar o dia e o ano que vai secar o rio, o lago, as plantas vão morrer, os animais e nós também, por falta de água. E é o que estamos vendo”, lembrou Mario Nicacio.

A terra Raposa Serra do Sol foi homologada em 2005 com 1,7 milhão de hectares. A população é  formadas por indígenas das etnias Macuxi, Ingaricó, Wapichana, Taurepangue e Patamona.  Algumas comunidades da região vivem da criação de gado. Segundo o coordenador do CIR, em uma semana morreram mais de 50 cabeças de gado. A falta de água potável também afetou o planejamento do ano letivo dos alunos indígenas. “Pedimos apoio do governo federal, pois em algumas escolas não tem água para os alunos”, disse Nicacio.

Outra comunidade indígena que sofre com a falta de água por causa da estiagem é a Anzol, que está localizada na região rio Murupú, a 61 km de Boa Vista, seguindo pela rodovia BR-174 (no trecho entre Roraima e a Venezuela). Na comunidade vivem 52 pessoas divididas em 14 famílias de índios das etnias Macuxi e Wapichana.

Conforme a indígena Macuxi, Geiza Duarte, para conseguir água para o banho e cozinhar, as famílias caminham 11 km onde fica a comunidade vizinha. “A situação está muito complicada, mas isso não é de hoje, desde dezembro já sentimos a seca castigando nossas famílias”, disse.

Segundo ela, a produção de macaxeira e milho também diminuiu com a seca. “Com esse alimento é que tiramos o sustento da nossa família, a plantação de feijão é a única que ainda está vingando”, lamentou.

Geiza disse que as lideranças da comunidade pediram ajuda da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) e também da Fundação Nacional do Índio (Funai). Eles querem um poço artesiano no local, mas não foram atendidas. “A única resposta que dão é que não tem recursos, e nós ficamos assim, esquecidos”, questionou.

Em entrevista à agência Amazônia Real, o coordenador regional substituto da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Roraima, Riley Barbosa Mendes, disse que, em 2015, a Funai reconheceu o tuxaua Arão Almeida da Conceição, que é da etnia Guajajara e casado com uma indígena Macuxi, como líder comunidade do Anzol.

Segundo Riley Mendes, a terra indígena Anzol ainda não foi demarcada pela Funai, pois existe uma questão judicial que envolve uma empresa e fazendeiros. “Os indígenas entraram com um pedido de desapropriação o qual já foi encaminhado para Brasília”, afirmou. Leia entrevista com o tuxaua Arão da Conceição aqui.

Questionado sobre como a Funai vai minimizar o problema da seca na comunidade, Riley disse que “existe um setor chamado Questão Social. É através dele que a Funai faz um levantamento sobre os impactos da seca nas terras indígenas”.

Conforme Riley, foram enviadas à Brasília as reivindicações dos indígenas, dentre elas, a construção de poços artesianos. “Estamos esperando uma resposta. Nosso papel é pedir apoio para que se resolva a situação o mais rápido possível”, afirmou o coordenador da Funai em Roraima.

A reportagem da Amazônia Real procurou a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) em Boa Vista e também enviou perguntas para o coordenador do Distrito de Saúde Indígena (Dsei Leste), Joseilson Câmara, mas não recebeu respostas sobre as questões da Comunidade Indígena do Anzol.

Prevfogo tem apoio de brigadistas indígenas

O coordenador estadual do Centro Especializado de Prevenção e Combate aos Incêndios e Florestas de Roraima (Prevfogo) do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Joaquim Parimé disse que a situação da grande quantidade de focos de incêndios é preocupante em Roraima. O fogo atinge três regiões onde se localizam projetos de assentamentos Caroebe e Anauá e, nas áreas do entorno deles, todos localizados no sul do Estado.

Segundo Joaquim Parimé, a Terra Indígena Yanomami é uma das mais afetadas pelo fogo. “Na região fronteiriça (localidades de Repartimento, Rouxinho Apiaú e Campos Novos), entre os municípios de Iracema e Mucajaí, região central de Roraima, existem projetos de assentamento que estão pegando fogo e ficam próximos da TIY. A fumaça está chegando nas comunidades de Catrimani e Watoriki (Demini) ”, disse.

Nas outras terras indígenas, como Raposa Serra do Sol, localizadas no município de Uiramutã, Pacaraima e Normandia, e São Marcos, no município de Pacaraima, não têm ocorrências de grandes incêndios, segundo dados do Prevfogo.

O combate ao fogo, segundo Joaquim Parimé é feito por 135 brigadistas que trabalham nas regiões atingidas, para tentar controlar esses incêndios para que não fiquem contínuos e se perca o controle. Ele disse que mais 45 homens estão chegando do Distrito Federal para atuar no combate aos incêndios florestais.

 “Contamos com apoio de aeronaves que sobrevoam a TIY, que ajudam no monitoramento dos focos de incêndio. O Prevfogo também trouxe 15 brigadistas da etnia Xerente de Tocantins, índios acostumados a trabalhar no combate ao fogo na área de floresta”, disse o coordenador estadual do Prevfogo.

Os brigadistas Xerente, segundo ele, estão atuando nas comunidades indígenas Catrimani e Demini, na terra Yanomami, além da região dos índios Waimiri Atroari, localizada entre o norte do Amazonas e o sul de Roraima, onde houve um pequeno incêndio, que já foi controlado, de acordo com o coordenador do Prevfogo.

Conforme Joaquim Parimé, com base em dados do Monitoramento de Queimadas e Incêndios do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), no mês janeiro foram registrados 1.754 focos de incêndio em Roraima. “No histórico que temos desde 1999 até o ano 2000, durante o mês de janeiro registramos algo em torno de 490 a 500 focos. Hoje, um recorde infelizmente negativo”, disse. Leia mais aqui.

Com relação ao combate aos incêndios florestais, Joaquim Parimé afirmou que o Prevfogo e outras instituições parceiras como a Defesa Civil, Corpo de Bombeiros do Estado estão mais equipados. Quanto a origem do fogo, o coordenador não responsabiliza o fenômeno El Niño mais intenso, e sim a ação humana.

“Em Roraima a característica da derrubada das áreas para confecção de uma roça é um modo de posse da terra. Tendo uma estrutura fundiária nesse modelo, é lógico que vamos ter os danos socioambientais”, disse Parimé.

Segundo o coordenador do Prevfogo do Ibama, houve um aumento da população nos assentamentos agrários públicos. Ele disse que também cresceu as ocupações irregulares e com isso o desmatamento. “Há uma pressão muito grande em cima dos recursos naturais nessas áreas próximas à terra indígena Yanomami, nas fronteiras dos municípios de Mucajaí e Iracema. Hoje a situação é de alerta”, afirmou Joaquim Parimé.

Unidades de Conservação em riscos

Christian Berlinck, coordenador nacional de Emergências Ambientais do Prevfogo/Ibama, disse que ao entorno das principais Unidades de Conservação de Roraima o fogo é uma constante. “Temos duas situações: no centro sul onde se localiza a Estação Ecológica de Caracaraí e o Parque Nacional do Viruá. Todos os dias estamos em combate”, afirmou.

Segundo ele, nessas unidades de conservação a vegetação é de capim canarana, onde o fogo se espalhar facilmente. A Estação Ecológica de Caracaraí é margeada pelo baixo rio Branco e tem uma área de 80.560 hectares. Já o Parque Nacional do Viruá tem 217 mil hectares e está sendo atingido pelo fogo numa faixa de 15 km.

Na Floresta Nacional de Roraima (Flona Roraima), diz o Berlinck, há focos de incêndios também. A unidade de conservação tem uma área de 167 mil hectares. “Na Flona Roraima o fogo está entrando pela parte sul, em uma área de floresta, onde está tendo desmatamento, justamente na divisa com a Terra Indígena Yanomami. Estamos trabalhando por terra porque também há indícios que esses incêndios sejam associados ao garimpo”, disse coordenador nacional de Emergências Ambientais do Prevfogo.

Na estação Ecológica de Maracá, Berlinck disse que a ameaça de fogo vem das fazendas e dos assentamentos públicos. A Estação Ecológica Maracá está situada nas margens do rio Uraricoera, a 135 km de Boa Vista, no município de Amajari. ”Com essa questão da regularização fundiária, de ocupação de novas áreas, estamos trabalhando na borda [da estação] para que ele [o fogo] não entre”, disse Christian Berlinck.

Conforme Berlinck, é necessário que a população tenha sensibilidade e comprometimento, pois o fogo “impacta no clima, na saúde, na alimentação, na disponibilidade de água, e na questão econômica também. Por exemplo, muitos rebanhos de gado, estão morrendo. Uma coisa importante para as pessoas saberem é que quando acontece isso, o governo tem que investir muito recurso financeiro e esses recursos poderiam ser empregados em outras questões sociais de saúde que estão deixando de ser empregados para podermos controlar esses incêndios”, afirmou Christian Berlinck, do Prevfogo do Ibama.

 

Artículo elaborado por Janaína Souza para Amazônia Real. Texto original disponible en: http://amazoniareal.com.br/el-nino-godzilla-fogo-invade-terras-indigenas-em-roraima/